13 julho 2005

Um desesperado em Oxford

Rodney Needham é um antropólogo social inglês. Mais que isso, Needham é um residente das torres de marfim de Oxbridge: um caso emblemático de uma cultura sob ameaça (ou irrevogavelmente comprometida) no pós-guerra. Ameaçada ou comprometida pelo gentio, i. é, proletários, mulheres, estrangeiros, e cientistas, afinal todos aqueles que vieram corromper a universidade com os seus estranhos modos de vida. A usar uma expressão cunhada por W. H. Auden, Needham é um representante das "antigas culturas de pedantismo (conceit)" (v. "In Memory of Sigmund Freud", 1939). Desenvolveu trabalho de terreno no sudeste asiático e escreveu copiosamente sobre parentesco e simbolismo.
Em 1972, Needham publica um livro imensamente influente. Refiro-me a Belief, language, and experience (Chicago, The University of Chicago Press). O livro inspira-se em Wittgenstein e Lévy-Bruhl, figuras às quais é, aliás, dedicado. A tese é basicamente a seguinte: a "crença" é um vocábulo/conceito culturalmente específico (ele não é passível de ser traduzido em inúmeras línguas onde como conceito nem sequer existe: exemplo Penan, exemplo Nuer, etc.); a "crença" não se reporta a quaisquer experiências internas aos sujeitos universalmente codificável; em última análise, a "crença" revela a impossibilidade em se aceder ao interior seja de quem for, como, em grande parte, todos os denominados conceitos psicológicos.
O livro é digressivo, reiterativo, titubeante, em suma, um daqueles pedaços de prosa académica erudita e grotescamente chata.
O que me parece de salientar são as desesperadas observações finais (a lembrar Hofmannsthal) acerca da impossibilidade da linguagem revelar o mundo ou o pensamento. E era aqui que eu gostaria de chegar. Needham escreve em conclusão (são mesmo as últimas palavras do livro): "The solitary comprehensible fact about human experience is that it is incomprehensible" (p. 246).
Ou seja, volvidas 246 páginas à procura de uma "redenção" argumentativa, o leitor encontra apenas desespero epistemológico, e não pode deixar de lamentar o tempo perdido a escutar o pedante professor inglês na sua prosa titilante e trituradora. O leitor não pode deixar de registar que Needham depois desta proposição suicidária (para um antropólogo e não só) continuou a ensinar, orientar teses, a escrever e a publicar.
Alguém deveria ter-lhe aconselhado a leitura de Álvaro de Campos: "Se te queres matar...", ou Nietzsche (tudo o que ele diz já tinha, aliás, sido dito por Nietzsche em "Acerca da verdade e da mentira no sentido extramoral" um quase rigoroso século antes): "Simplifica a tua vida, suicida-te".