02 março 2006

Casa de férias 5, variação



- Mas claro que pode fazer, Groucho, porque não haveria de poder re-escrever tudo o que existe?
- Não é o poder da potência a que me refiro, é o poder do kairós...
- A oportunidade?
- Sim, a oportunidade. Mas um pouco mais do que isso, também. Alguma coisa parecida com a oportunidade coincidir com o destino.
- Percebo. Quer dizer, parece-me que o percebo. Mas nesse caso esqueça a questão.
- E porquê, se é que se pode saber?
- Porque é uma questão da crítica, não do escrever.
- Mas escrever não é desde logo a crítica de tudo o que foi escrito?
- Claro, Groucho, tem toda a razão. Crítica e homenagem e outras coisas que podemos ler nos ensaios e que os autores sabem muito bem, mesmo que não o saibam segundo a linguagem dos ensaios. Mas escrever só começa depois.
- Depois?
- Depois. (pausa) O problema é que nunca se sabe exactamente quando é que começa o depois. Ou quando já começou a ser depois.
- Percebo, só se sabe muito depois do depois já ter começado.
- É assim que as coisas são.
- Porque são como são.
- Porque são como me são.
- Foi o que eu disse.
- Este silêncio chega-lhe, Groucho?