05 setembro 2005

Interlúdio em um Acto (cena 2)


















Boca de Cena – Então, o que é que se passa?
Pano – Não se passa nada.
Boca de Cena – Passa-se alguma coisa.
Pano – Não se passa nada!
Boca de Cena – Eu bem vejo pelas tuas olheiras que se passa alguma coisa.
Pano – Não se passa nada.
Boca de Cena – Estiveste a chorar?
Pano – Um pano não chora.
Boca de Cena – Pois não. Mas se chorar também não há nada de mal nisso, pois não?
Pano – Isso é o que tu dizes.
Boca de Cena – Repara em mim, por exemplo: estou sempre a abrir e a fechar, falo, canto, suspiro, calo-me, e até choro. E não me acontece nada, pois não?
Pano – Mas isso és tu. Com um pano não é a mesma coisa.
Boca de Cena – Mas tu não és um pano qualquer!
Pano – Pois não! Por isso mesmo...
Boca de Cena – Por isso mesmo o quê?
Pano – Deveria haver mais respeito.
Boca de Cena – Mais respeito?
Pano – Sim.
Boca de Cena – Mas o que é que se passa?
Pano – Não se passa nada!
Boca de Cena – Diz, não tenhas receio. Sabes que estou sempre a teu lado.
Pano – Lá isso estás.
Boca de Cena – Vês?