18 janeiro 2006

Capítulo em que se abre o envelope

Cara Clara (e clara Cara),

É bom voltar a lê-la. Como sabe, tenho andado arredado do clube, não por misantropia arredia, mas antes pela entropia corredia que me tomou conta dos dias. Corre dia, corre, the policeman said. Não preciso que me lembre que devo ser senhor do meu destino. Bem sei. Mas quem controla as ânsias e as circunstâncias? Quem? Não me teria posto a digitar se não sentisse na urgência da sua comunicação um apelo a que não consigo ficar imune. Não tema o tema. Nada direi que vá além dos estreitos limites da discrição e do decoro. Descrição de coro, digamos. É o cavalheiro que há em mim quem se deixa interpelar. Aliás, é sempre ele, a minha cara-metade, minha cara. Metade daquilo que nos acontece permanece obscuro. Esse envelope, se for igual a um que eu encontrei na caixa em Dezembro, já não é o primeiro. Perguntar-me-á: mas por que não disse nada? Bom, talvez fosse da melancolia metálica que tomou conta do clube no começo do Inverno. Que, dias e dias a fio, parecia ser o clube de um só. E um só é sempre mal acompanhado. Era o Casmumrro. Via-me sozinho, entre quatro paredes, e sabe a inércia que isso provoca. Tentei abrir os ficheiros que vinham no CD mas estavam encriptados, e só aparecia um código incompreensível. Fiquei com a impressão de que seriam imagens, mas é apenas uma conjectura. Quem sabe se há alguma ligação com as vozes que a Clara ouviu nessa gravação? É isso que temos de descobrir. Agora que me trouxe o envelope de novo à memória, não descansarei enquanto não desencriptar os ficheiros. Quem sabe se alguns dos mistérios do clube não serão finalmente desvendados? Aguardo, com expectativa, a volta do correio.