01 novembro 2005

Diário de uma apoiante de Manuel Alegre à Presidência

Como pôde Soares, após décadas de caminho comum, fazer aquilo a Alegre?! A política, ou é um vínculo afectivo em torno de projectos e valores, ou não é nada, como tão bem disse o nosso poeta. Alegre comportou-se de modo irrepreensível em toda esta embrulhada. Manifestou a sua disponibilidade para avançar, quando a sua candidatura parecia não poder ser mais do que um sacrifício à ética partidária a que sempre foi fiel; hesitou e recuou (ou pareceu recuar, para quem se fiou nas aparências sabiamente manipuladas), no jantar de Viseu, ainda por fidelidade à ética partidária e a uma amizade de décadas; mas houve um momento em que tudo se tornou incontrolável: os apelos incontidos das massas, veiculados por militantes descontentes no interior do PS, a arrogância e insensibilidade de Soares (e Sócrates?), o imperativo de algo maior do que a ética partidária: a consciência de um homem livre e indomável.
E querem agora que ele desista em favor de um Soares gasto e sem uma ideia? Agora que o povo desce à rua ao apelo da redondilha e do decassílabo heróico? Nem pensar. Não é possível enganar toda a gente todo o tempo, meu caro Mário. Para isso já basta o Cavaco… Em frente, Manuel, em frente! O nosso povo tem um encontro marcado com o destino em Janeiro, e desse encontro sairá o Portugal futuro de que falava outro poeta maior. Um Portugal em que a poesia esteja de novo na rua e seja de novo possível exigir o impossível. Um país que, ao invés do verso de Sophia, não mais nos «mate lentamente». Como tentaram fazer a Camões. E a Alegre. Mas a verdade é que, como há muito se sabe, apenas os poetas perduram, em tempo de contabilistas.