Uma comodidade
— Não me vai dizer que tenho feito falta, ou vai?
— Não, meu caro senhor, não chego a tanto. Mas continuo a insistir. Sabe que está longe de ser um dos cavalheiros da minha predilecção…
— Sei, e agradeço a franqueza, ó alma simples!
— Perfeitamente, senhor, perfeitamente. Mas acho lamentável que nada tenha dito, nem num sentido nem noutro, a respeito da minha proposta.
— Ora, Groucho, essa proposta provocou a maior comoção que este clube já conheceu. Vai para aí uma confusão que nem se acredita… E porquê, afinal? A ideia em si mesma não tem pés nem cabeça… confesse que resolveu gozar um pouco connosco…
— De todo, meu caro senhor, de todo. Era muito séria, essa minha proposta.
— Pois, se insiste, digo-lhe já qual vai ser a minha posição: só aceito, se esse clube de leitura restaurar a prática de leitura individual que vigorava na Grécia antes de Aristóteles.
— Agora é o senhor a divertir-se à minha custa.
— De todo, Groucho. Sabe decerto que o livro conheceu diferentes formas e tamanhos, nem todos fáceis de manipular. Parece que na Grécia as pessoas que liam na verdade não liam, tinham um escravo que segurava o livro e o lia em voz alta: os leitores, no sentido que hoje damos à palavra, só usavam do corpo os ouvidos, para ouvir o que o escravo lia. Parece também que o Aristóteles foi o primeiro filósofo a ler ele próprio os livros… imagine a revolução. Ou imagine que, em vez de ler, sozinho, no seu quarto, ou que nós, em vez de estarmos aqui cada um a ler para seu canto, tínhamos alguém, um leitor ou uma leitora, sentadinhos ao lado, a ler em voz alta e, ponto muito importante, a segurar no livro. Que me diz? Isso parece-me o único clube de leitura aceitável nos dias de hoje.
— Insisto na minha: está a divertir-se à minha custa. Onde entra nisso a ideia de clube?
— Não é óbvio? O clube teria esses leitores ou leitoras como tem jornais, bilhares, poltronas, estantes. Uma comodidade. Ou um utensílio, se quiser ser mais neutro. Um homem chegava aqui, sentava-se, chamava um dos leitores e pedia-lhe «leia-me alguma passagem adequada ao meu estado de espírito». O leitor, se fosse perspicaz e competente, sacava do livro adequado e lia. Quer melhor?
— Não, meu caro senhor, não chego a tanto. Mas continuo a insistir. Sabe que está longe de ser um dos cavalheiros da minha predilecção…
— Sei, e agradeço a franqueza, ó alma simples!
— Perfeitamente, senhor, perfeitamente. Mas acho lamentável que nada tenha dito, nem num sentido nem noutro, a respeito da minha proposta.
— Ora, Groucho, essa proposta provocou a maior comoção que este clube já conheceu. Vai para aí uma confusão que nem se acredita… E porquê, afinal? A ideia em si mesma não tem pés nem cabeça… confesse que resolveu gozar um pouco connosco…
— De todo, meu caro senhor, de todo. Era muito séria, essa minha proposta.
— Pois, se insiste, digo-lhe já qual vai ser a minha posição: só aceito, se esse clube de leitura restaurar a prática de leitura individual que vigorava na Grécia antes de Aristóteles.
— Agora é o senhor a divertir-se à minha custa.
— De todo, Groucho. Sabe decerto que o livro conheceu diferentes formas e tamanhos, nem todos fáceis de manipular. Parece que na Grécia as pessoas que liam na verdade não liam, tinham um escravo que segurava o livro e o lia em voz alta: os leitores, no sentido que hoje damos à palavra, só usavam do corpo os ouvidos, para ouvir o que o escravo lia. Parece também que o Aristóteles foi o primeiro filósofo a ler ele próprio os livros… imagine a revolução. Ou imagine que, em vez de ler, sozinho, no seu quarto, ou que nós, em vez de estarmos aqui cada um a ler para seu canto, tínhamos alguém, um leitor ou uma leitora, sentadinhos ao lado, a ler em voz alta e, ponto muito importante, a segurar no livro. Que me diz? Isso parece-me o único clube de leitura aceitável nos dias de hoje.
— Insisto na minha: está a divertir-se à minha custa. Onde entra nisso a ideia de clube?
— Não é óbvio? O clube teria esses leitores ou leitoras como tem jornais, bilhares, poltronas, estantes. Uma comodidade. Ou um utensílio, se quiser ser mais neutro. Um homem chegava aqui, sentava-se, chamava um dos leitores e pedia-lhe «leia-me alguma passagem adequada ao meu estado de espírito». O leitor, se fosse perspicaz e competente, sacava do livro adequado e lia. Quer melhor?
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