21 setembro 2005

Crise

— Foi impressão minha, ou o senhor chamou-me?
— Deixe-se disso, Groucho, não o chamei e não foi impressão sua. Se quer conversa, diga logo.
— Não se trata de conversa. Começo a ficar inquieto, isso sim. O senhor está para aí há vários dias, sisudo, macambúzio, ninguém lhe arranca uma palavra. Intriga-me, e inquieta-me.
— Estou em crise, Groucho, só isso.
— Ah… crise… pessoal?
— Pessoal? Acho que sim, não vejo que outra coisa possa ser…
— Por pessoal entendo pessoal mesmo, coisas íntimas…
— Entende mal: é pessoal por envolver a minha pessoa, não a sua, embora, claro, o desfecho o atinja sempre.
— Como assim? Atinge-me? Desfecho? Tinha razão em ficar inquieto, já vejo.
— Não, homem, não se inquiete. A crise, etimologicamente, é um momento decisivo. Ou para um lado ou para o outro, percebe? cura ou morte. Eu tento decidir-me... Devo falar ou ficar em silêncio? Devo escrever ou falar? Devo publicar ou devo conversar? Devo… entre a palavra e o silêncio, posso decidir-me? Ora, Groucho, vá-se embora.