18 agosto 2005

Droláticos e pilheriáticos (série de verão)

TIPOS EXEMPLARES, 1
A ciência da chateação, segundo certa corrente moderna, apresenta três princípios básicos: o homem nasce com a tendência natural de exercer a chateação; a chateação é uma exorbitância, tolerada, dos direitos do homem em sociedade; em determinadas situações, todo o homem é capaz de produzir chateação.
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A ciência ainda pode ser resumida numa única frase: damos o nome de chato ao indivíduo que produz um tipo de chateação diferente do nosso. A classificação de todos os tipos está ainda muito incompleta, mas poderemos, apresentar algumas figuras, a título de curiosidade.
Há um tipo de gente que não te deixa contar vantagem. Se viste a Kim Novak, ele jantou com ela. Se vais a Paris no ano que vem, ele vai dar a volta ao mundo na próxima semana. Se ganhaste algum dinheiro, ele está milionário. Se lhe contas, pelo contrário, que andas perdendo dinheiro, ele está na mais negra miséria. Se viste uma senhora desmaiar na rua, ele viu uma velha a despencar-se do edifício da Noite. O tipo é denominado NEC PLUS ULTRA.
O tipo amoroso, afectivo, chama-se AB IMO PECTORE (do fundo do peito). Traz um eterno elogio no lábios. Pergunta pela patroa e pelas ciranças com exemplar regularidade. Faz um ar de extrema compaixão se lhe dizes que o Pedrinho anda meio resfriado. Não admite de maneira alguma que lhe pagues o café. Tem a respiração triste, audível, e o olhar é lânguido.
HABEAS CORPUS é o tipo que, depois de uma hora de conversa, na qual se explica um assunto sem interesse, dá uma folga e se despede. Pois, mal chega em casa, o telefone toca: é ele que retorna ao assunto pelo fio.
(Continua.)


De Antologia esquecida na mesa de cabeceira, fl. 77b