19 julho 2005

Queering Hatari!




















- Venha cá, Groucho, venha cá…
- Mas que chinfrineira! E isto é música?
- Não, Groucho, isto não é música. Isto são 6.25 minutos de felicidade: «Hatari!», por Don Byron. Chegue-se cá, homem! Dê cá a mão…
- Mas… Mas… O senhor tá doido?
- Qual quê! Agarre-se bem a mim que eu levo-o pela sala…
- Mas, Sr. Silvestre! Por favor! Que irão dizer os outros senhores?
- Ora, que o senhor até dança melhor do que seria previsível num indivíduo sempre tão hirto.
- Não me refiro a isso, senhor. Mas sim à questão…
- Ora, homem, nunca viu nos arraiais as mulheres do povo desinibidamente a dançar umas com as outras?
- Pois, mas não têm propriamente bigode…
- Engana-se. Às vezes até que têm…
- E se a gente parasse? O senhor já fez o gosto ao pé…
- Ó homem, não se arreceie, que eu não o como!
- Francamente, senhor! Que linguagem…
- Deixe correr o marfim, Groucho. Aliás, sendo o tema do Hatari!, é mesmo de deixar correr o marfim.
- Se alguém me vê, nunca mais arranjo emprego noutro clube.
- Tolice. Nos dias de hoje, se consta que o Groucho dança pelo salão com os membros do clube, a sua cotação sobe e não é pouco! Todos os clubes deste país o vão querer contratar.
- Acha, senhor?
- Não duvide! E depois, lembre-se daquela frase dos anos 60: «No futuro tomos seremos Queer por 15 minutos».
- Mas os anos 60 foram noutra dimensão…
- Também é verdade. Mas enfim, sempre o poderemos ser por 6.25 minutos. O tempo de Hatari!.
- Mas isso não era um filme com o John Wayne? O senhor não está a fazer insinuações sobre a virilidade dele, pois não?
- Essa da virilidade… Eu só queria era dançar esta música. E como neste clube só há homens… E como até simpatizo com esse seu queixo bem vincado…
- O senhor incomoda-me, com essas brincadeiras…
- Olhe que ali o Sr. Baptista está com ar de quem quer também dançar consigo… Já não se escapa.
- O que me vale é que a música está a acabar. Uff…
- Não se esqueça do Replay... Olhe que é o comando fundamental do aparato Queer… Tocar de novo aquilo que, por essa razão, é sempre coisa diferente. Play it again, Sam.
- Não me diga que agora isso também é queer, gaita!
- Gata?! Enfim, adiante, que a música está a acabar. Começo a sentir a melancolia de um belo momento já passado…
- Bom, bom…
- E se puséssemos a música de novo, Groucho? A felicidade é sempre tão fugaz… Felicidade na África…
- Na Austrália, senhor, na Austrália! A citação correcta do Álvaro de Campos é com os antípodas.
- Se ele o dizia… Que disso sabia ele.
- Também é verdade. E casmurro era ele!
- Se era! Você, seu maganão!, é um casmurro bem mais doce…