Nem mais!
- Quem viu este país e quem o vê! Já reparou como agora temos equipamentos culturais ao nível do que de melhor há no mundo? Serralves, a Casa da Música, o próprio CCB…
- Nem mais!
- E olhe que as nossas novas gerações de criadores também pedem meças! Antigamente, gastavam-se décadas a soletrar os mesmos nomes: Vieira da Silva, Paula Rego, Paula Rego, Vieira da Silva… Agora, todos os anos surgem revoadas de novos talentos, a internacionalização é rápida, as galerias vendem que se fartam na ARCO… Outro mundo, meu caro!
- Nem mais!
- Os próprios críticos e curadores se internacionalizam, já reparou? O Alexandre Melo sempre a curar em NY, a Isabel Carlos a curar na Austrália! E depois há o Pinharanda no Público e o Pomar no Expresso (não percebo por que razão aquele diabo não escreve livros e se consome a fazer a crítica do tempo que passa), e, lá para cima, o BPA, aqueloutro do Porto com nome alemão… Vivemos tempos de verdadeira pujança crítica!
- Nem mais!
-Não se percebe é esta indecisão em relação à Colecção Berardo. Falta por aqui um gesto de longo alcance. Tranchons le mot, falta um Carrilho! Esperemos que ele ganhe as eleições, para a colecção ficar na capital, como deve ser!
- Nem mais!
- É que, não sei se já reparou, aquela malta do Porto, sempre com o choradinho do centralismo lisboeta, já lá tem o Museu de Arte Contemporânea, em Serralves, o Centro Português de Fotografia, na Cadeia da Relação, e a Casa da Música! Qualquer dia, a capital fica com as sobras. Que temos nós para apresentar como alternativas? A Gulbenkian? A Culturgest? As Janelas Verdes? O Museu do Chiado? O S. Carlos? O CCB? A Cinemateca? O Museu dos Coches? Ora, batatas!
- Nem mais!
- Aqui para nós, ainda bem que o Benfica ganhou o campeonato, para reequilibrar um pouco as coisas... Até porque convém não esquecer que a Paula Rego é aqui da Linha, e mais o Cabrita Reis e quase toda a malta de talento. Lá no Porto, o que é que aqueles humilhados e ofendidos têm - além do bairrismo serôdio? Os montes de feno e os paus amontoados do Alberto Carneiro? As piroseiras engraçadinhas do Albuquerque Mendes? Aqueles galhos eróticos, a carvão, do José Rodrigues? As borratadas do Resende? Francamente, o que é isso ao pé da radicalidade das pinturas brancas do Sarmento? Ou da infinita variação temática e formal do Molder?
- Nem mais!
- É por isso que precisamos mesmo da colecção Berardo cá. Qual Sintra, quais queijadas! Na capital, até para reforçar o cosmopolitismo da cidade - a nossa única cidade cosmopolita, e o resto é fado vulgar! No Pavilhão de Portugal ou em qualquer outro sítio (a mim, aquela pala do Pavilhão faz-me sempre comichão: só espero não estar debaixo dela no dia em que aquilo cair…). É que se não nos apressamos, qualquer dia ainda o Belmiro e o Amorim, mais o Artur Santos Silva, com aquele bairrismo doentio, a metem nos jardins de Serralves! Grandes como o caraças!, se me permite… No outro dia fiquei estafado só de ir lá ao fundo ver uma escultura provisória do Richard Long (uns galhos no meio do caminho – ia-os pisando…) e voltar para trás. Se não for Lisboa, que seja noutro sítio qualquer, menos no Porto. Olhe, desastre por desastre até mesmo Coimbra é preferível ao Porto! Ou Idanha!
- Nem mais!
- É que tem de haver um módico de racionalidade nestas coisas, caramba! Já viu a estafa que, além do mais, representa para os nossos críticos irem ao Porto (sem TGV, ainda por cima!) só para verem uma exposição ou ouvirem um concerto? Mesmo com o e-mail, que lhes permite enviar os textos antes de regressarem à capital, é sempre um dispêndio irracional de energias. Porque a verdade, que ninguém tem coragem de dizer – e assumir! – é que o centro do país, ao contrário do que para aí corre, é Lisboa – veja bem o mapa, veja! Mais uma manifestação da doença do politicamente correcto, habilmente manipulada pela malta do Norte... Logo, por uma questão de optimização de recursos, mais a mais em época de vacas magras, faz todo o sentido que os equipamentos fiquem aqui. Porque isso facilita as visitas à maioria das pessoas interessadas em arte neste país (já viu o transtorno, para um eborense, de ir à Casa da Música ao Porto? ou o que seria termos de ir ao Porto para assistir a uma ópera?); e porque, a continuar esta onda de Casas da Música, Museus e Teatros Municipais por esse país fora, qualquer dia o jornalismo cultural torna-se inviável, com tanta deslocação! Transforma-se em turismo cultural, inapelavelmente. Como diria o Adorno, mais uma acha para a fogueira da indústria da cultura… Razão tem a Clara Ferreira Alves, que só sai da Casa Pessoa para visitar o Auster em Brooklyn, o Saramago nas Canárias ou o Rushdie lá pela Inglaterra! Se não for assim, quem é que aguenta?
- Nem mais!
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