Droláticos e pilheriáticos
AS PALAVRAS QUE NINGUÉM DIZ
— Sabe o que é diadelfo? Não sabe. É isso aí: ninguém aprende mais nada na escola, não há professor que ensine o que é diadelfo. Entretanto, basta você sair por aí, na Gávea, e dá de cara com penca de diadelfos. Tão fácil distingui-los. Pelo visto sou capaz de jurar que você nunca experimentou a emoção do ilapso. Ou por outra: pode ter experimentado, mas sem identificá-lo pelo nome. Não alcançou a maravilhosa consciência de haver merecido o ilapso. Conheci um nordestino que na mocidade exercera a profissão de ultor, e que ignorava o que é ultor; como é que pode ser tão mau profissional?
Praticamente, as coisas deixaram de ser nomeadas na boca dos falantes. O vocabulário azulou. São incapazes de reconhecer o que é beltiano, e mais ainda de qualificá-lo. Paranzela, já ouviu falar? /…/ Fui cumprimentar uma campeã de ténis, chamando-a lindamente de vitrice, e ela abespinhou-se. Achou talvez algo de venéfico no vocábulo. Sabe ténis e não sabe o idioma.
Vamos dar uma volta seral? propus a outra moça, que arregalou os olhos. Não houve meio de convencê-la de que pretendia levá-la por aí, sob a paz das estrelas. Imagine se eu lhe propusesse subsiles. Ainda que eu aplicasse o máximo de catexe, não conseguiria nada. E talvez até ela chamasse a polícia.
Carlos Drummond de Andrade, Os Dias Lindos (1977)
De Antologia esquecida na mesa de cabeceira, fl. 8a
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