17 junho 2005

Paraíso carnívoro

No paraíso carnívoro foi assim. Antes de se saberem nus, na fracção de segundo anterior à nudez, Eva carnívora e Adão carnívoro aperceberam-se de que nem um nem outro tinham tido umbigos. A ciência do umbigo não lhes viera de Deus ou da Serpente. Nem deuses, nem serpentes, nem búfalos ou bacorinhos tinham umbigos. Não havia umbigos comparativos, nem relativos nem absolutos. Nem o paraíso carnívoro tinha umbigo – como um ralo que toda a banheira tem – nem sequer, pudessem ela e ele ter lido a Bíblia, nem sequer a Bíblia tinha umbigo – qual orelha ou boca que escoasse o que houvesse que escoar. Eva carnívora e Adão carnívoro, tentados pela Serpente, viram a barriga do outro como maçã suculenta, o que aliás se pode comprovar no quadro de Jan Van Eyck. Morderam as carnosas maçãs mútuas, e depois o mal já estava feito.