Ter razão antes de tempo
- Está? Sr. Silvestre?
- Sim?
- É o Groucho, de Viana.
- O Groucho de Viana?!
- O Groucho, de Viana, senhor. Com vírgula no meio.
- Ah bom, percebo. E então a que devo esta honra, meu caro?
- Leu o Público de ontem, senhor?
- Não, porquê? Não me diga que já cá temos a gripe das aves!
- Não, não, afaste pra lá esse cálice. Era por causa da coluna do Sr. Prado Coelho.
- E então?
- Chamava-se «Teu corpo está a nevar»…
- É sobre a Serra da Estrela?
- Não, senhor, é sobre Tolentino Mendonça, e é verso dele, que EPC analisa: «Reparem: não é o meu corpo que neva mas o teu. Para Tolentino de Mendonça a questão do corpo é fundamental. Não apenas do corpo do outro mas também do corpo do outro». Sempre pedagógico: reparou no «reparem»?
- E há mais?
- Sim, muitos versos citados e lidos. A questão é justamente essa, senhor.
- Não sei se o acompanho…
- Lembra-se daquele PS ao balanço de 2005 em que ele se referia a «um livro de poemas que vejo referido mas nunca me chegou às mãos: A Estrada Branca de José Tolentino Mendonça»?
- Sim, claro.
- Pois dá ideia que o livro já lhe chegou às mãos.
- Os CTT são das coisas que melhor funcionam neste país, Groucho.
- Pois, mas a questão também ainda não é exactamente essa.
- Ena, isso é que é diferir a questão… Diga lá então qual é a dita, ó Hitchcock de Viana (sem vírgula).
- A questão é que, lendo os versos, a gente percebe que EPC tinha toda a razão em incluir o livro no balanço de 2005, e mesmo sem o ler. Logo, acho que lhe devemos um gesto de contrição.
- Se o meu amigo o diz… Está a ver como eu tinha razão? Os grandes críticos nem precisam de ler os livros para lhes reconhecer a valia. São seres oraculares.
- E ainda há quem diga mal de Gaspar Simões por ele, ao que consta, ter também esse dom…
- Isto é um país de gente medíocre e invejosa, Groucho. E maledicente, ainda por cima.
- E então agora, com a proliferação de blogues, o que para aí vai de má-língua…
- Ui, ui…
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