Leituras anticlericais de Groucho
O catolicismo e os Habsburgos tiveram neste milénio uma acção aniquiladora na cabeça do nosso povo, uma acção mortal, como nós sabemos e como nos prova tudo o que na Áustria somos levados a considerar. O catolicismo, pode-se dizer, eliminou neste milénio o pensamento no nosso povo e fez florescer a música, que ele considerava a menos perigosa de todas as artes. Somos apenas o país da música, porque o espírito foi sempre inteiramente reprimido entre nós durante séculos, dissera eu a Gambetti. Tornámo-nos um povo completamente musical, porque nos tornámos um povo completamente falto de espírito nos séculos católicos, tinha eu dito a Gambetti, na medida em que o catolicismo foi de nós banindo o espírito, fomos nós fazendo nascer e medrar a música, ainda assim é a esta circunstância que devemos Mozart, Haydn, Schubert, disse eu. Mas não me agrada absolutamente nada, tinha eu dito a Gambetti, que tenhamos Mozart, mas não uma cabeça própria, Haydn, mas esquecido o pensamento e a ele renunciado quase por completo, Schubert, mas tenhamos, em suma, caído na estupidez. Em mais parte nenhuma aconteceu, dissera eu a Gambetti, que um país deixasse a Igreja católica tirar-lhe sem escrúpulos o pensamento, deixasse que, por assim dizer, o catolicismo o decapitasse.
Thomas Bernhard, Extinção, trad. de José A. Palma Caetano
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